É compreensível estar cansado do modernismo. Aquilo que despontou no início do século vinte como uma mudança radical em nossa disciplina - afastando-se dos cânones então tradicionais da arquitetura - acabou se tornando apenas uma sombra daquilo que um dia fora, uma fantasia por trás da qual muitos arquitetos passaram a se esconder. A racionalidade (genuína ou não) passou a ser assumida como uma estratégia para defender-se das críticas e justificar os resultados. O limite entre a arquitetura moderna de fato e suas outras tantas formas oportunistas e perversas, tornou-se invisível e praticamente impossível de identificar.
Não podemos esquecer jamais que foi o modernismo que nos devolveu o entusiasmo e a alegria, a possibilidade de sonhar com um futuro melhor para todos. Inovações tecnológicas trouxeram não apenas soluções técnicas para problemas práticos, elas foram responsáveis também pela melhoria da qualidade de vida das pessoas. Cada dia uma nova descoberta, pequenos passos para os homens e passos tão grandes para a humanidade, e melhor, tudo ao alcance de todos. O modernismo era uma espécie de passagem grátis para o futuro, um trem que todos estavam convidados a subir. A monumentalidade de seus projetos era tão grandiosa quanto éramos capazes de sonhar.
Paul Rudolph, o modernista americano da arquitetura brutalista, quem idealizou um mega projeto para a cidade de Nova Iorque, morreu sem ver o seu maior sonho concretizado. Por isso, em comemoração ao centenário do seu nascimento, os arquitetos Lasse Lyhne-Hansen e Philipp Ohnesorge revisitaram o seu famoso projeto, utilizando esboços e textos conceituais para modelar e renderizar o enorme projeto que teria transformado para sempre a maior cidade dos Estados Unidos.
“LOMEX Revisitado” é uma visão alternativa do que teria sido a cidade de Nova Iorque a partir do ponto de vista de Rudolph, uma "obra-prima desprezada e nunca construída". A proposta foi banida e abandonada depois que um grupo de ativistas liderados por Jane Jacobs se opôs veementemente contra o projeto de Rudolph. Felizmente podemos ver com clareza hoje em dia que se estes projetos urbanos fracassados tivessem sido construídos, nenhum deles teria sido bem-sucedido - mas por outro lado, sua capacidade imagética e distópica nos fazem quase palpitar de excitação.
De fato, entusiasmo e otimismo são coisas extremamente palpáveis em nossa profissão atualmente. Projetar arquitetura é como sonhar com um futuro melhor, seja qual for a sua forma (ou qual seja o futuro desejado). Em uma entrevista publicada esta semana com Jürgen Mayer H, o arquiteto falou sobre a sua própria interpretação desse otimismo contemporâneo, explicando que “... eu vejo meus projetos sob uma lente através da qual o contexto é utilizado para revelar algo novo. A arquitetura é um catalisador, que não é apenas o pano de fundo para a vida cotidiana, mas algo que nos faz repensar o espaço onde vivemos”.
Durante a entrevista o arquiteto foi desafiado a refletir sobre seu papel como um "arquiteto de projetos icônicos" - algo que era bem visto no início do século XXI mas que parece cada dia mais fora de moda. Mas o que nos leva a criticar cada vez mais a formalidade ou "iconicidade" destes projetos? Trata-se de um problema de fato formal ou é apenas uma questão de abordagem?
Talvez seja um problema de método, de processo. Os programas que estamos utilizando hoje em dia, com os quais desenvolvemos o projeto nosso de cada dia, foram concebidos para facilitar os processos de documentação e entrega, não são ferramentas muito bem calibradas para explorar diferentes possibilidades. Será que precisamos de fato responder a prazos tão enxutos sempre?
Em um artigo publicado originalmente pelo CommonEdge, Michael Crosbie fala sobre o poder e a importância do desenho, defendendo que com um croqui por dia seremos capazes de melhorar a nossa arquitetura. Há um certo temor da falta de objetividade de um esboço - algo que é relativamente justificável quando parece tão fácil criar coisas que parecem estar bem resolvidas. Esboçar é uma espécie de aceitação da incompletude que desnuda o processo de projeto. Em um esboço, tudo pode ser reduzido à apenas uma impressão. Não é um problema formal mas experimental.
Mas não é exatamente isso o que mais importa?